Todo mundo quer ter tempo hoje em dia. Dizem que este é um dos ativos mais valiosos. “Rico é quem tem tempo”, já dizia um cara chamado Costinha. Eu acho isso também. Eu gostaria de ter mais tempo do que o tempo que eu tenho, porque ele cabe só na caixinha do trabalho. Mentira: sobra um espaço pro congestionamento da ida, o da volta e pra dormir. Mas às vezes eu penso que se eu tivesse mais tempo, acabaria, fatalmente, tendo mais trabalho pra caber nesse tempo.
Nesse momento, nada tenho para fazer. Então resolvi sentar e escrever sobre o assunto, só para não perder o costume de arrumar alguma coisa para fazer. A consciência do profissional moderno cosmopolita pesa demais ao assumir o ócio, nem que por alguns instantes, até lembrar que a frase conclusiva daquela defesa de posicionamento do novo cliente ficaria ainda melhor se fosse reescrita.
A escassez de tempo não combina, definitivamente, com perfeccionismo. O perfeccionista é um sujeito quase tão obsessivo, que precisa de tempo para concluir alguma coisa que traga satisfação para si. Fato comprovado: perfeccionismo é uma característica em extinção. Evoluirá junto com o ser humano e seus novos hábitos e vai acabar sumindo, assim como o dente siso, as unhas e alguns cabelos do corpo. Assim como – dizem – o rabo nos abandonou (fisicamente) por uma questão evolutiva – perdeu a utilidade quando nos tornamos seres bípedes. O perfeccionismo perdeu a utilidade ao nos tornarmos ocupados demais.
Que triste saber que essa característica caiu de moda. E se formos analisar profundamente, a categoria está perdendo mercado. O clássico transtorno obsessivo compulsivo, a mania de perseguição e outras demonstrações de traumas infantis ou lacunas psicológicas evidentes estão em desuso no mundo ocupado. Tudo é tão cronometrado que as pessoas acabam até parecendo mais normais. A gente nem percebe mais o tiques do auxiliar administrativo, que pisca o olho ao mesmo tempo em que enruga o canto da boca; do trainee que marca as folhas de papel com a bunda da xícara embebida no café que escorreu no pires. E talvez seja assim que adolescentes perturbados passam despercebidos até fuzilarem a escola inteira. Vai ver sobrou um tempinho no dia e o cara resolveu se ocupar. A culpa é do tempo que nos falta.
Em outros tempos, o tempo respeitava a necessidade particular de todo o ser humano em manifestar suas idiossincrasias, mas isso eram outros tempos. Tempos onde até a palavra idiossincrasia era mais usada – pasmem! Certamente é por isso que os casamentos e outras formas ditas normais de relacionamentos entre seres humanos estejam fracassando com tanto sucesso. Minha vizinha ainda não conseguiu assinar o divórcio porque os horários não batem – os dela, os do candidato a ex-marido e os dos advogados. O juiz é o único que parece ter horário, mas como ele é funcionário público, definitivamente não se encaixa nessa tese.
Há uns meses eu comprei uma casa e o meu banco me ofereceu um produto onde, pagando uma pequena taxa eu conseguiria ter um atendimento mais rápido do que o normal. Espetacular – o banco me cobra para ser ágil, ou seja, ele cobra por um serviço em cima do serviço que eu já tenho como correntista, que paga taxas e outros dinheiros para ter direito a ser cliente do banco. Em se tratando de uma das instituições mais lucrativas do universo (não passei nem perto dos subprimes) ele já não deveria saber que o serviço para o cliente do mundo ocupado tem que ser mais rápido sempre? Aceitável – assim como eu pago para que a empresa de filtro de café seja ecologicamente correta utilizando papel reciclado e melhore a sua imagem com o meu dinheiro. O mundo ocupado não tem tempo nem para ter bom senso.
O Domenico Demasi defendeu o ócio criativo – um momento em que fazer nada pode fazer toda a diferença na sua vida. O meu amigo alternativo lá de porto alegre inventou o nadismo, um tipo de ritual em que as pessoas se concentram para não pensar em nada e deixar que a cabeça vá pra qualquer lugar vazio, branco, inócuo durante 15 minutos, todos os dias. Ou seja: tem gente investindo o seu tempo em desenvolver maneiras de fazer com que as outras pessoas busquem tempo para não fazer nada. Incrível.
Essa semana, após muita reflexão, decidi que vou acrescentar algum desses novos conceitos ao meu job description, contando inclusive pontos para o atingimento das minhas metas pessoais na empresa. Vou inclusive sugerir que esse se torne um novo pilar de rendimento da empresa, e que seja aplicado a todas as outras áreas estratégicas como um novo passo da organização rumo ao futuro, à modernidade. Obviamente vou embasar muito bem o meu raciocínio através das grandes teorias vigentes; vou ler os estudiosos, os especialistas e montar uma defesa sobre o assunto. Assim que me sobrar um tempinho.
quarta-feira, 24 de setembro de 2008
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Um comentário:
Oi Ferculha! Gostei do blog! Vai ser ótimo poder ler tuas opiniões aqui!
Acabei de criar um comentário muito trí, mas ainda não sei mexer nessa merda e acabei deletando s/ querer (vaias para o retardado pentelho). Aí fiquei com preguiça de escrever tudo de novo...
Beijos e boa sorte na casa nova.
Vocês merecem!
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